A Vingança dos Caretas
- Pai, precisamos conversar.
- Espere um pouco meu filho. Deixa o papai terminar de apertar esse baseado.
- (Saco...)
- Quer um tapinha meu filho?
- Pai, você sabe que eu não fumo. Aliás, o assunto tem a ver com isso. Essa porcaria é ilegal, é o que alimenta o tráfico, que por sua vez sustenta a violência que você tanto reclama e...
- Besteira! Esse daqui nem é comprado! Ganhei do vizinho, ele planta em casa. Não sei o que aconteceu com meu fornecedor....
- Eu queria falar sobre isso também.
- Pode se abrir aqui com seu velho.
- Talvez você não tenha percebido, mas desde pequeno eu tenho essa coisa que me sufoca, não consigo mais esconder.
- Pode dizer, você é homossexual? Eu entendo perfeitamente.
- Não pai, gosto da Fernanda, namoro com ela há dois anos. E antes dela tive três namoradas.
- Que desperdício! O filho do vizinho já comeu todo mundo; homem, mulher, cachorro, nada escapou. Só falta você me dizer que é fiel. Quando eu tinha sua idade eu participava de surubas que duravam a noite inteira.
- Eu sei, pai. Não precisa me lembrar. Pensei muito em como falar isso com você, mas acho que o melhor é falar de uma vez: Pai, eu sou careta.
- O que você está me dizendo, Zabaluê?
- Zabaluê não, pai! Eu mudei meu nome para Carlos há três anos.
- Como assim?! O nome que eu e sua mãe escolhemos com tanto carinho.
- Tem mais, pai. Sabe aquele emprego na ONG de direitos humanos? Era mentira, trabalho como policial civil há cinco anos.
- Que vergonha! Um filho meu policial! Não aceito! Ponha-se daqui para fora, Zabaluê!
- Carlos, pai. E se acalme. Eu já vou sair, mas ainda não acabou.
- O que mais falta você me dizer? Sua mãe já sabe disso?
- Sabe sim, pai. Ela entendeu. Até me desejou sorte na minha opção.
- Traição! Como ela teve coragem de fazer isso comigo?
- Lembra da eleição do ano passado? Votei no Bolsonaro.
- O QUÊ?!?!?!?!
- Tem mais. Estudei um pouco e não acredito que o comunismo seja solução para coisa alguma. O livre mercado...
- Cale-se! Como ousa defender o capitalismo dentro dessa casa? Onde foi que eu errei, meu Deus?
- Pai, você não acredita em Deus...
- Não me enche o saco! Todo mundo sabe que a religião é o ópio do povo.
- E o marxismo o ópio dos intelectuais.
- Como você tem coragem de falar uma coisa dessas? Olhe os exemplares d’O Capital ali na estante. Você os leu? Pelo menos sabe do que está falando?
- Tem também um tal de Adam Smith...
- Traidor! Saia daqui! Não agüento mais! Que vergonha! Um filho careta! De direita! E eu que dei todas as liberdades possíveis. O que deu errado?
- Pronto, pai. Falei. Estou indo. Só mais uma coisa: o seu fornecedor a gente grampeou semana passada. Você só não dançou ainda porque é meu pai. Mas é melhor andar na linha....
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